A resposta curta e direta é sim. Uma empresa falida tem que pagar dívidas, mas o processo é bem diferente do convencional. A falência não funciona como uma borracha mágica que apaga todas as obrigações. Pelo contrário, ela organiza a "bagunça" através de um procedimento judicial para vender tudo o que restou e pagar os credores de forma justa, seguindo uma fila de prioridade determinada pela lei. Este guia explica exatamente como tudo funciona.
Acesso Rápido
- 1 Entendendo o processo de falência empresarial
- 2 A ordem de prioridade para pagamento quando a empresa falida tem que pagar dívidas
- 3 O processo de falência explicado passo a passo
- 4 A responsabilidade dos sócios quando a empresa falida tem que pagar dívidas
- 5 A recuperação judicial como uma alternativa à falência
- 6 Dúvidas Frequentes sobre Dívidas de Empresas Falidas
Entendendo o processo de falência empresarial
Quando uma empresa quebra, ela entra em um processo legal totalmente supervisionado pela Justiça. Pense nisso não como um ponto final, mas como uma grande "arrumação da casa" antes de fechar as portas de vez. O objetivo principal é transformar todos os ativos — imóveis, máquinas, estoque — em dinheiro para quitar as contas pendentes.
A falência é decretada por um juiz e, a partir daí, os donos perdem o controle do negócio. O juiz nomeia um administrador judicial, uma figura-chave que assume o comando da chamada "massa falida" — que nada mais é do que o conjunto de todos os bens e direitos da empresa.
Todo esse caminho é guiado pela Lei nº 11.101/2005, que dita as regras do jogo. A parte mais importante dessa lei é que ela estabelece uma ordem de prioridade para o pagamento dos credores. Ou seja, a legislação define quem recebe primeiro, garantindo que o processo seja transparente e justo.
Por que a falência não significa o fim das dívidas?
A falência existe justamente para organizar o pagamento das dívidas, não para cancelá-las. A lógica é simples: se a empresa não tem mais como operar e pagar o que deve, seus bens precisam ser usados para compensar o prejuízo de quem ficou aguardando para receber.
O processo é desenhado para conseguir o máximo de valor com os ativos restantes e, assim, pagar o maior número possível de credores. As etapas principais são:
- Arrecadação de bens: O administrador judicial localiza e reúne tudo o que pertence à empresa.
- Liquidação dos ativos: Os bens são avaliados e, em seguida, vendidos, geralmente em leilões judiciais.
- Pagamento dos credores: Com o dinheiro em mãos, o administrador começa a distribuir os valores, seguindo rigorosamente a fila de preferência definida em lei.
Importante: Quando a falência é decretada, as cobranças individuais são suspensas. Todas as dívidas são concentradas nesse único processo. Isso evita que um credor mais rápido receba tudo e deixe os outros de mãos abanando, garantindo que a distribuição siga as prioridades legais.
A realidade econômica mostra que entender se uma empresa falida tem que pagar dívidas é uma questão cada vez mais comum. Um levantamento recente apontou que o número de falências decretadas cresceu cerca de 25% nos últimos quatro anos, saltando de 622 em 2021 para 780 em 2024, com projeção de novos recordes. Esses números reforçam que, mesmo quebradas, as empresas continuam responsáveis por seus débitos. Leia mais sobre o cenário de falências no Brasil.
A ordem de prioridade para pagamento quando a empresa falida tem que pagar dívidas
Quando fica claro que uma empresa falida tem que pagar dívidas, a grande questão é: quem recebe primeiro? A Lei de Falências (Lei nº 11.101/2005) não coloca todo mundo no mesmo barco. Ela cria uma hierarquia bem definida, uma espécie de "fila VIP", para que o dinheiro arrecadado quite primeiro as dívidas mais críticas.
Pense nessa ordem como uma pirâmide. No topo, com prioridade máxima, estão os créditos mais urgentes. Conforme descemos, a prioridade diminui. Entender essa lógica é essencial para saber o que esperar do processo.
Os primeiros da fila: créditos trabalhistas e acidentários
No topo absoluto da lista estão os créditos trabalhistas. A lei é clara em proteger os funcionários, garantindo que salários atrasados, verbas rescisórias (férias, 13º) e indenizações por acidentes de trabalho sejam os primeiros a serem pagos.
Essa prioridade tem uma razão social óbvia: essas dívidas são "alimentares", ou seja, essenciais para o sustento dos trabalhadores. A lei, no entanto, estabelece um teto: o pagamento prioritário é limitado a 150 salários mínimos por empregado. O valor que exceder isso perde o privilégio e vai para o fim da fila, junto com os credores comuns.
O infográfico abaixo ajuda a visualizar essa hierarquia de pagamentos.
Como podemos ver, o processo sempre começa pelas dívidas com os trabalhadores e só avança para as outras categorias depois que a anterior é totalmente quitada.
Credores com garantia e o Fisco
Logo depois dos trabalhadores, a fila segue com os credores com garantia real. São aqueles que, ao emprestarem dinheiro, exigiram um bem específico da empresa como garantia, como um banco que financiou um imóvel ou uma máquina. Esse bem fica "amarrado" à dívida.
Na sequência, vêm os créditos tributários, que são as dívidas com o governo. Impostos federais, estaduais e municipais (como ICMS, IPI, ISS) entram aqui. A única exceção são as multas tributárias, que perdem essa prioridade.
A lógica por trás dessa ordem é equilibrar interesses: primeiro, quem depende do dinheiro para viver (funcionários); depois, quem foi prudente e exigiu garantia; e, por fim, o Estado.
A tabela a seguir resume essa hierarquia de forma direta.
Hierarquia de Pagamento de Credores na Falência
Esta tabela resume a ordem legal de prioridade para o pagamento das dívidas de uma empresa falida, conforme estipulado pela Lei nº 11.101/2005.
| Ordem de Prioridade | Tipo de Crédito | Exemplos Comuns | 
|---|---|---|
| 1º | Créditos Trabalhistas e Acidentários | Salários, férias, 13º salário, FGTS, indenizações por acidente de trabalho (limitado a 150 salários mínimos). | 
| 2º | Créditos com Garantia Real | Financiamentos de imóveis ou máquinas, hipotecas, penhores. | 
| 3º | Créditos Tributários | Impostos federais, estaduais e municipais (ICMS, IPI, ISS, IRPJ, CSLL). Multas não entram aqui. | 
| 4º | Créditos com Privilégio Especial | Dívidas com credores específicos definidos em lei, como custas judiciais do processo de falência. | 
| 5º | Créditos com Privilégio Geral | Dívidas com credores específicos definidos em lei, mas sem um bem específico como garantia. | 
| 6º | Créditos Quirografários | Fornecedores de produtos, prestadores de serviços, aluguéis, empréstimos sem garantia. | 
| 7º | Multas e Penas Pecuniárias | Multas contratuais e tributárias. | 
| 8º | Créditos Subordinados | Dívidas com os próprios sócios ou administradores da empresa que não sejam funcionários. | 
Entender essa classificação é fundamental, pois define a probabilidade real de um credor receber o que lhe é devido.
Os últimos a receber: quirografários e subordinados
Na base da pirâmide, encontramos os credores quirografários. Este é o grupo mais numeroso e, infelizmente, o que tem menos chance de receber. Aqui entram fornecedores, prestadores de serviço e credores sem garantia.
Por último, na lanterna, estão os créditos subordinados. Basicamente, são os próprios sócios e administradores da empresa. A lei parte do princípio de que eles assumiram o risco do negócio e, portanto, devem ser os últimos a receber.
O processo de falência explicado passo a passo
O processo de falência segue uma lógica bem definida para organizar a "casa" de uma empresa que quebrou e garantir que as dívidas sejam pagas da forma mais justa possível.
Tudo começa com um pedido na Justiça, que pode vir da própria empresa ou de um credor. Se o juiz acatar, ele decreta a falência e nomeia o administrador judicial.
Esse administrador assume o controle de tudo o que compõe a "massa falida" — o conjunto de todos os bens, direitos e obrigações da empresa.

A arrecadação e a liquidação dos ativos
A primeira grande tarefa do administrador judicial é a arrecadação. Ele precisa fazer um pente-fino para encontrar, identificar e listar tudo o que pertence à empresa: imóveis, máquinas, estoque, dinheiro em conta.
Com o inventário pronto, começa a fase de liquidação. O objetivo é transformar todos esses bens em dinheiro vivo, geralmente por meio de leilões judiciais, que buscam conseguir o melhor preço possível.
Essa agilidade é crucial, pois bens parados podem se desvalorizar e gerar custos, diminuindo o montante final para pagar as dívidas.
O pagamento dos credores
Com o dinheiro em caixa, chega o momento de, finalmente, pagar os credores. É aqui que a pergunta "uma empresa falida tem que pagar dívidas?" é respondida de forma concreta.
O pagamento não é feito de qualquer jeito. Existe uma fila de prioridades rigorosamente definida por lei: primeiro trabalhadores, depois credores com garantia real, seguidos pelos tributos e, só então, os demais.
A falência funciona como um "concurso de credores". Ela junta todas as dívidas em um só processo, impedindo que um credor mais ágil execute um bem sozinho. A ideia é garantir que a distribuição do que sobrou seja organizada e equitativa.
O cenário econômico atual mostra a relevância do tema. Os primeiros trimestres de 2025 viram um recorde de empresas pedindo recuperação judicial no Brasil, com o setor industrial liderando com 1.112 pedidos. A recuperação é uma tentativa de evitar a falência, mas quando falha, a obrigação de quitar as dívidas com os ativos restantes se impõe. Saiba mais sobre o recorde de recuperações judiciais no Brasil.
A responsabilidade dos sócios quando a empresa falida tem que pagar dívidas
Uma das maiores angústias de um empreendedor é saber até onde vai sua responsabilidade pessoal. Afinal, quando uma empresa falida tem que pagar dívidas, os sócios precisam usar o próprio dinheiro? A resposta depende do tipo de empresa e de como ela foi administrada.

Para a maioria das empresas no Brasil, como Sociedades Limitadas (Ltda.) e Sociedades Anônimas (S.A.), existe o princípio da separação patrimonial. Pense nisso como um muro que separa os bens da empresa (CNPJ) dos bens pessoais dos sócios (CPF).
Esse muro, a personalidade jurídica, protege seu patrimônio pessoal. Em um cenário ideal de falência, apenas os ativos da empresa seriam usados para pagar os credores.
Quando o muro da proteção pode ser derrubado
Este muro, contudo, pode ser derrubado. A Justiça tem uma ferramenta para isso: a desconsideração da personalidade jurídica. Esse mecanismo permite que o patrimônio pessoal dos sócios seja usado para pagar as dívidas da empresa.
A desconsideração da personalidade jurídica é uma medida extrema. Ela só é usada quando fica claro que a estrutura da empresa foi usada de forma fraudulenta, com a intenção de prejudicar credores, funcionários ou o governo.
O juiz só autoriza a derrubada do muro se houver provas de má-fé ou irregularidades graves, como:
- Fraude contra credores: Esvaziar o caixa ou vender bens de propósito para não pagar dívidas.
- Confusão patrimonial: Misturar finanças da empresa e pessoais, como usar a conta da empresa para pagar contas de casa.
- Desvio de finalidade: Usar a empresa para atividades ilegais.
Se uma dessas práticas for comprovada, o patrimônio pessoal dos sócios pode ser usado para quitar as dívidas.
Responsabilidade em diferentes tipos de empresa
O nível de proteção do patrimônio pessoal varia conforme a estrutura do negócio.
Responsabilidade dos Sócios Conforme o Tipo de Empresa
| Tipo de Empresa | Regra Geral de Responsabilidade | Exceções Comuns | 
|---|---|---|
| Ltda. e S.A. | Limitada ao capital social. O patrimônio pessoal dos sócios, em regra, é protegido. | Desconsideração da personalidade jurídica por fraude, confusão patrimonial, dívidas trabalhistas e fiscais com comprovação de má-fé. | 
| MEI e Empresário Individual | Ilimitada. Não existe separação legal entre o patrimônio da empresa e o do empresário. São a mesma coisa para a lei. | Nenhuma. O empresário responde com todos os seus bens pessoais pelas dívidas do negócio. | 
A melhor forma de manter o "muro" de proteção é ter uma gestão transparente e uma separação rigorosa entre as finanças da empresa e as contas pessoais.
A recuperação judicial como uma alternativa à falência
Antes da falência, existe um mecanismo legal pensado como uma rota de emergência: a recuperação judicial. Imagine-a como uma UTI para empresas, um ambiente controlado onde o negócio ganha fôlego para reorganizar as finanças.
Ao contrário da falência, que visa fechar a empresa, a recuperação judicial luta para salvá-la. A lógica é que é mais vantajoso para a economia e para os credores manter a empresa funcionando, preservando empregos.
Como funciona na prática?
Ao pedir recuperação judicial, a empresa ganha um respiro. A lei garante 180 dias de suspensão de todas as cobranças. Esse tempo permite que a gestão, supervisionada por um administrador judicial, monte um plano de como pagar as dívidas e voltar a ser lucrativa.
Esse plano é apresentado aos credores, que votam para aprová-lo ou não. Se a maioria concordar, o plano é validado pelo juiz, e a empresa começa a colocá-lo em prática.
A recuperação judicial mostra que, embora uma empresa falida tenha que pagar dívidas de forma liquidatória, a lei prioriza dar uma chance para que a operação se reerga. O foco é viabilizar o pagamento das dívidas de forma sustentável.
A crise econômica dos últimos anos jogou luz sobre esse mecanismo. No Brasil, segundo a FecomercioSP, 7,2 milhões de empresas estavam inadimplentes em 2025. Diante disso, os pedidos de recuperação judicial dispararam 61,8% em 2024. Cerca de 80% das empresas que passam por esse processo conseguem retomar suas operações. Saiba mais sobre a crise silenciosa e o recorde de recuperações judiciais no Brasil.
Dúvidas Frequentes sobre Dívidas de Empresas Falidas
O tema da falência sempre levanta questões. Separamos aqui as perguntas mais comuns sobre se uma empresa falida tem que pagar dívidas, com respostas diretas e claras.
Quanto tempo um processo de falência demora no Brasil?
Depende. Casos mais simples, com poucos bens e credores, costumam levar de dois a quatro anos. Cenários complexos, com disputas judiciais ou muitos ativos, podem se arrastar por mais de uma década. A competência do administrador judicial e a velocidade do tribunal também influenciam o prazo.
O que acontece com os funcionários quando uma empresa quebra?
Com a falência, os contratos de trabalho são encerrados. A boa notícia para os funcionários é que seus direitos (salários atrasados, férias, 13º, FGTS) têm prioridade máxima na fila de pagamento. Eles precisam habilitar seus créditos no processo para garantir que sejam pagos antes da maioria dos outros credores.
Conselho: Se você é um ex-funcionário nessa situação, procure ajuda jurídica. Garantir que seus direitos sejam corretamente representados no processo é crucial.
Dá para reabrir uma empresa depois que ela faliu?
Não. Uma vez que o juiz encerra o processo de falência, a empresa é legalmente extinta. Ela deixa de existir e não pode ser "reaberta". No entanto, os sócios, se não cometeram nenhum crime falimentar (como fraude), estão livres para começar um novo negócio com um novo CNPJ.
Como um credor descobre que uma empresa faliu e o que fazer para cobrar a dívida?
A falência é um ato público. A decisão do juiz é publicada em editais e no Diário Oficial. Além disso, o administrador judicial costuma contatar os credores conhecidos. Se você é um credor, deve pedir a habilitação do seu crédito no processo, apresentando os documentos que provam a dívida para entrar na lista de pagamentos.
Se sua empresa enfrenta um momento delicado ou se você é credor de um negócio que faliu, ter orientação especializada é fundamental. No Pedro Miguel Law, oferecemos o suporte jurídico necessário para navegar nesses processos, protegendo seus interesses. Entre em contato conosco e descubra como podemos te ajudar.
 
		


